Conversas entre duas amigas no limite da inadequação

:/

... da descrença

Amiga,

Eu também me lembro de quando acreditei. Lembro-me de quando a gente repetia insistentemente, nos encontros com os amigos, os versos que nos davam a identidade exata da nossa revolta com a mediocridade das pessoas com quem convivíamos: “vamos pedir piedade... pra essa gente careta e covarde”. Lembro-me de nos fazer miseráveis, numa ironia que nem todos notaram, nem mesmo quem se colocava em um lugar de representação cultural.

Sabiam que nós líamos Victor Hugo e Dostoiévski. Sabiam que não estávamos no mesmo lugar... Não quero, com essa fala, parecer soberba ou cheia de mim, mas de fato não tínhamos aquele tamanho. Um primo me disse isso uma vez e hoje eu posso ver tudo claramente. E não penso que isso tenha alguma relação com a busca de um “príncipe encantado”, como você colocou. Isso simplificaria muito as coisas... até porque não há mal algum em se encontrar a pessoa certa para sua vida.

Acho que a relação maior é com a nossa projeção intelectual. Era tudo sobre o vazio que a gente sentia quando queria conversar coisas que iam além do corte de cabelo, o capítulo da novela ou os dramas pessoais de alguém, e não tinha ninguém para nos ouvir. Porque, a partir do momento em que nos dispusemos a seguir esse caminho, passamos a lidar com a impossibilidade de nos saciar, que é típico de quem busca o conhecimento.

E esse caminho não tem volta... não há como arrancar o que a gente já sabe de dentro de nós. É irremediável! Tanto quanto desacreditar...

Abraço,

Lígia

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One Response so far.

  1. O príncipe encantado porque é a coisa mais simples que se pode pensar quando se quer uma vida simples e indolor.

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